9 de outubro de 2016

Dislexia...

Este texto foi escrito e reescrito milhares de vezes, e continuo a pensar que não está tão bom, nem nunca vai estar comparado ao filme "Como estrelas na Terra". Se nunca viram e vos interessa o problema e a sua relação com o meio social e psicológico, aconselho-vos a verem (o início pode ser um bocadinho aborrecido, mas depois vai valer a pena).


"A Dislexia do desenvolvimento é considerada um transtorno específico de aprendizagem de origem neurobiológica, caracterizada por dificuldade no reconhecimento preciso e/ou fluente da palavra, na habilidade de descodificação e em soletração. Essas dificuldades normalmente resultam de um défice no componente fonológico da linguagem e são inesperadas em relação à idade e outras habilidades cognitivas." - Definição da International Dyslexia Association (IDA em 2002)

A partir do momento em que te é diagnosticado Dislexia, nunca nada mais vai ser igual...
No meu caso, passei uma fase de recusa, de "porquê eu" e a temida exclusão social. Os meus pais passaram também por todos estes pontos (todos repito, incluindo a exclusão social), mas sem nunca deixar escapar o amor, o carinho e confiança em mim, era o que eles me diziam e eu sempre senti.
Um dia, ouvi uma conversa atrás da porta, ficará para sempre marcada na minha mente, diziam que eu provavelmente nunca ia conseguir ir para a faculdade. Não vou negar o desespero que senti, o nó no estômago e a raiva de não ser o que eles mereciam, acreditem eles são tudo para mim e eu dava tudo para ser a filha perfeita que não tenho dúvidas, eles merecem!
Obviamente também fiquei triste com as palavras, mas depois disso percebi que estava ao meu alcance fazer com que aquilo que eles diziam não acontecesse de facto.


Eu sou dona da minha vida,
não a marioneta de quem diz que vou falhar!
Afinal, porque é que eu não ia conseguir ir para a faculdade?
Era menos que quem?

Não percebi logo como, mas sabia que ia à luta só não sabia a difícil guerra que tinha pela frente. Andei no psicólogo, na pedagogia e nas explicações, tudo pago pelos meus pais (a preço de ouro), a minha vida foi assim durante muitos anos, a aprender o que não fazia sentido para mim... a fixar as letras e regras que não tinham sentidos na minha cabeça... a jurar que nunca mais me ia deixar pisar pelos outros...
As coisas foram evoluindo e, eu fui aprendendo muito nesses anos, não só em relação a mim ou à língua portuguesa, mas também sobre a sociedade, a crueldade do homem, há palavras que nunca vou esquecer: "burra"; "estúpida"; "não te quero aqui". Nenhuma criança devia ter de as ouvir, nenhum adulto devia ter a coragem de as pronunciar.
Dói muito mais do que se pode imaginar e, só deixou de doer tanto quando eu aprendi o meu verdadeiro valor e me aceitei tal como sou.

Por isso, hoje admito sem medo, sim, eu tenho dislexia!
Não quero ser vista como a coitadinha ou a deficiente, como tantas outras vezes fui, por isso mostro o que sou, o que valho.
Se pensarmos bem a dislexia nem é um problema assim tão grave (comparado com a Paralisia Cerebral ou Síndrome de Down) e, depois eu não sou burra, nunca o fui, porque é que havia de começar a ser quando me dão este diagnóstico?
Acreditem, quem dera a muitos ter uma compreensão e maneira de ver os outros e a vida como eu! Esse é o meu ponto forte, ouvir mais do que falar, ver mais do que julgar, pensar antes de falar, mas nunca deixar de dar a minha opinião, eu sou assim. Não digo isto, porque penso ser melhor que alguém, mas sim porque tenho de me valorizar, porque se eu não me valorizar, ninguém vai fazê-lo, chamasse "amor próprio". Ainda que esteja em construção e a minha auto-estima ainda não esteja nos picos da minha ingénua felicidade de criança, eu estou a lutar.
Continuo, a lutar todos os dias, para que a dor não magoe tanto!

Já não me importo com o que dizem, nem se gostam de mim, a única coisa que importa é que eu esteja feliz, puramente feliz. Isso depende dos meus amigos e familiares, dos meus estudos e da minha vida pessoal e profissional. Nada mais importa! Quando caiu na tentação de deixar de pensar assim, relembro quem sou, de onde venho e todos os que tenho ao meu lado, eu sou uma lutadora e isso nunca ninguém poderá tirar de mim.

Lutei quando todos diziam que não ia conseguir, cai de todas as vezes que me pregaram uma rasteira e ainda assim continuei a levantar-me, chorei de todas as vezes que me maltrataram, mas limpei todas essas lágrimas, enfrentei os meus problemas e de todos os que estavam à minha volta (porque sou assim como uma esponja e absorvo tudo), lutei ao seu lado e contra quem fosse preciso. Não me importei de dar a minha opinião, mesmo que fosse a única a pensar assim, mesmo que me excluíssem ou chamassem louca, afinal a história está cheia de loucos que mudaram o mundo não é verdade?
É isso que eu quero ser: uma louca que muda o mundo e, se eu não conseguir ser uma louca que muda o mundo, então pelo menos serei uma louca e isso já ninguém me tira! A vida é tão tramada e dá tantas voltas, que dificilmente alguém pode dizer que não é louco por aguentar tudo isto.
Eu serei uma louca feliz, com um sorriso nos lábios, que refletem todos os diferentes sorrisos que já vi e já dei e, um brilho nos olhos, olhos que imaginam unicórnios a voar quando viajo de autocarro, ou abelhas a saltar de lugar em lugar, para mim o mundo será sempre um lugar animado, desde que seja esse o meu estado de espírito.


Hoje, não escondo que tenho dislexia, assim como não escondo que estou feliz com a pessoa em que me estou a tornar, tudo devido a tudo e todos os que estiveram ou não presentes na minha vida.

Por isso e para acabar, obrigada a todos os que me maltrataram, a todos os que me humilharam e rebaixaram, obrigada pelo diagnóstico de dislexia, e obrigada sobretudo a quem fez com que eu não me tornasse no meu diagnóstico, mas sim em quem sou hoje.

Obrigada dislexia, fizeste de mim alguém bem melhor, bem mais forte e frágil ao mesmo tempo e é um orgulho saber que sempre terei a tua companhia na minha vida, sempre serás parte de mim e eu de ti.

Aos meus pais, nenhum obrigada será suficiente, mas eu sei o orgulho que têm em mim, assim como sei que sempre fui a filha perfeita aos vossos olhos, vocês não podiam ser maior inspiração para mim... Um dia quando for grande quero ser tão lutadora e positiva como tu, mãe, e tão trabalhadora como tu, pai. Em relação a ti, mana, quero ser tão empenhada no meu trabalho e sentir-me tão realizada como tu.
Foi graças a vocês os três que eu consegui ser assim, puramente feliz e perfeitamente imperfeita.


Obrigada Dislexia!

O olhar...

Os vossos olhares cruzam-se, os vossos corpos passam um pelo outro, voltas a olhar quando ele não está a ver e desvias, quando ele volta a olhar.
Quando ele te olha não sabes como agir, devias de ser capaz de o olhar de frente ou então talvez de continuares o que estavas a fazer, mas não consegues... tu não és assim... não sabes já o que é agir normalmente.
Já o tinhas visto antes e pensado o mesmo que agora: parece ser engraçado e talvez giro, mas isso é uma palavra demasiado térrea para aquilo que ele é, mas afinal o que ele é, o que sabes sobre ele, se não o conheces? Uma espécie de fascínio nasce...

Pode ser apenas aquela atração inicial e que acaba no mesmo momento que começou, ou então talvez não, mas nada disso importa.
Aprendi a acreditar na vida, o que me trouxer eu sei que vai ser bom, o que não vier é porque não valia a pena vir. Hoje, eu sei tudo vai correr bem, sempre correu e não há motivos para desta vez ser diferente.

Toledo - Espanha

Felicidades para ti, desconhecido.